sexta-feira, 27 de abril de 2012

(Im)Perfeito

Eu sempre lhe quis, nunca lhe recusei ou lhe mandei embora. Sempre dizia em pensamento que você tinha que ficar comigo e pronto. Muito egoísta, muito mandona, muito eu. Via no seu rosto a solução para todos os meus problemas. Pegava na sua mão e me teletransportava para outra realidade. Eu nunca pensei que eu poderia ser assim. Sempre critiquei todos que um dia apressaram o destino e proferiam as três benditas palavras que só se dizia pro Grande Amor da Sua Vida. Eu nunca fui tão idiota. Idiota de olhar pro teto e sentir falta, olhar pra cama e sentir falta, olhar pro nada e imaginar você comigo.
Era ofegante lhe amar. Pensar nas palavras certas, no momento certo e no movimento perfeito da boca, sempre pra nunca estragar o que Deus fez perfeito, era cansativo. A respiração acelerava e cansava quando virava de costas, tirava a camisa, colocava o bendito cabelo pra atrás da orelha, me afagava nos seus longos e frios braços, encostava os lábios na minha testa... Era como uma corrida diária de 10km que me fazia suar e pedir água, mas dava energia pra continuar e correr mais no próximo dia. Você era praticamente da velocidade de uma montanha-russa, do percurso de uma, dos rodopios, das quedas e principalmente da adrenalina, da emoção e do medo que me causava.
Eu lhe carregava comigo o dia inteiro. Carregava junto com a minha bolsa cheia de medo de lhe perder, de lhe deixar cair e quebrar no chão. Minha garras nunca se abriram quando você estava por perto sempre precavendo alguma situação que poderia tirar você de mim. Utilizei de tudo: amor, sexo, beijo, sono, comida, musica e até mesmo de futebol. Seguia o plano do Pra Sempre e o ouvia ao som da música que embalava os nossos principais momentos. Começava nos beijinhos com Chico e terminava nos amassos ao som de um belo e alto rock. Juntamente com o rítimo das músicas minhas garras se abriam e se fechavam, motivo das grandes marcas nas suas costas, dançando e brincando de nunca mais sair daquelas quatro paredes que testemunharam todos os momentos que lhe tinha como meu.
Era tudo perfeito, você era perfeito, Deus era perfeito, até o mendigo que passava na rua era cheiroso, bonito, bem cuidado e perfeito. De tão perfeito que era impossivel de descrever o que eu sentia. A perfeição, de tão inatingível, acaba sendo indescritivel também e você era assim, impossivel de se descrever. Abusava de uma inteligencia, de uma certeza, de uma luz própria que nem a mulher mais segura de sí ousava discordar daquela boca e dos gestos ao defender alguém, uma idéia. Tinha uma personalidade muito própria, não a flexionáva por ninguém. Vivia um dia de cada vez, um dia hoje, um dia lá no futuro e falava que sabia que seria rico, inteligente, ia cuidar de crianças e ser solteiro, "não vou casar, pra que casar? viver preso a uma só mulher, ter filhos pra que? gastar o dinheiro com pessoas que vão te esquecer, vou ser cirurgião dentista! rico!". Você era tão perfeito que eu repetia 200 vezes por dia que nada era certo, nunca essa perfeição vai acabar e nada vai me tirar de você. Nós casariamos, mudariamos pro interior da Inglaterra, teríamos a grande menina que iria ter o mesmo sorriso que eu e pronto, uma família perfeita.
Demorava demais aceitar te largar. Era duro demais deixar você encostar os pés no chão e procurar as sandálias pra ir ao banheiro. Se demorasse mais de cinco minutos eu já perguntava se tinha acontecido alguma coisa. Era muito dificil me desacomodar dos seus braços, desentrelaçar minha mão da sua e descolar meus pés quentes dos seus frios. A gente sempre foi de ser oposto e de se misturar e de ser morno, nem frio e nem quente.
E quando você ia embora eu me sentia fraca, a vontade de comer desaparecia. Tudo fugia a cor. Todo sorriso era de ponta-cabeça. Não eram lágrimas, era um córrego saindo dos olhos. Nada tinha graça. Nada era perfeito. O salgado ficava insoço, o doce perdia a graça. Mas ai você aparecia no portão de casa e eu te via de cima de sacada, como uma cena de um filme italiano.
Você não tinha cavalo branco, armadura, espada e nem coroa, mas era um verdadeiro e perfeito príncipe pra mim.
Ontem você saiu, pegou os chinelos, demorou mais de cinco minutos no banheiro. Eu gritei e você não respondeu. Não devolveu as sandálias pro lugar ao lado da minha e nem voltou pra cama. Disse que não era o momento de ser meu e usou as benditas palavras: Eu quero viver...
Hoje você vive. Me liga. Me pede beijo. Me diz que sou perfeita. Mas de tanto esperar você voltar a esfriar meus pés e entrelaçar minhas mãos, eu cansei! Esperei deitada, sentada, em pé e logo deitei, cansei, dormi. O ticket da montanha-russa acabou, o carrinho voltou, a respiração acalmou e eu voltei pro solo firme e nem tão perfeito assim.
Eu te amei. Eu te amei muito. E há quem diga que eu ainda te amo. Você só não é mais perfeito. Só não tem mais braços longos e frios, pelo menos os meus braços longos e frios. O seu sorriso não pára o mundo e sua mão não me tranposta pra uma outra realidade. Você só me traz saudade da venda que eu coloquei no rosto por pensar que um dia a perfeição existisse e que ela existiria em você.